sexta-feira, 17 de maio de 2013

O CARCARÁ






















O Carcará
(volataria rés-do-chão, ou um close-up cabralino)



O carcará é o eco do eco,
Do eco seco,
Onomatopaico eco.

Falcão modesto
E sem estirpe
Que, não se apresta, de resto,
Aos exercícios fidalgos
Da caça em volataria.
Voa rés-do-chão, rasante,
Vôo sem nada elegante
Aqui mesmo, nas barrancas
À jusante ou à montante,
do leito seco do rio.


Tem um pouco de caprino (cabra alada?)
Quando escava o chão infértil
No vão das palmas de espinhos,
caçando o rato-preá
que se esconde entre as raízes.


Um pouco de cabra ou de ema,
Outra ave de pouco senso,
Pois não escolhe alimento.
Come tudo. Rato, lagarto e cobra.
E por que haveria de escolher
entre as pedras da escassez?

Vai reto e certeiro, ao ponto.
Bicho do mato, agreste e rude,
Não faz o arrodeio e o rito
Funéreo, assim como o abutre
Que espera a morte matar.

A fome, que dá sentido
Ao seu jeito de caçar,
Não lhe permite a espera.
E nem se diz que ele caça,
Pois caça é arte mui nobre,
Pra um bicho pobre e sem raça
Pra um bicho sem sobrenome.

O carcará vai bem reto
Guiado por sua fome
Não metaforiza a lida,
Não tem pena, não vacila,
Que nenhum dó lhe consome.
Pega e arrasta a lagartixa
Abre-lhe o ventre
E, ali, come.

Lições de vida
Pros homens,
Crias da caatinga braba,
Ventres e bocas aflitas,
São os carcarás e as cabras,
Emas, ratos, lagartixas;


Lições de vida
E de morte.
De fado, de sina e sorte,
Homem e bicho
Bicho e homem.
Fauna em flora estiolada.
Juntos na mesma desdita.

***********************************


Eurico,
reeditando signos cíclicos...rsrs


***********************************

Ao poeta, músico e cuidador de almas viventes,
Éverton Vidal.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

ESPERANÇA


Esperança
E. B. Brito





















Nenhuma realidade é estática,
feito uma fera empalhada na vitrine:

Essa que vemos sempre nos enlaça.
Mesmo que seja assim, umbrátil e baça,
E que algo, nela, pouco se define.

Poderá o incauto ser flaneur na vida
E deambular por sua circunstância
Como quem nada sente e nada vê...

Mas a realidade é onça e avança sobre a gente
Com dores e prazeres, e, de boamente,
Abocanha-nos o ser

Se houver Seca, então, bem dentro d’alma...

(e o estio é mais feroz que u'a mera onça,
é a melancólica sombra que ronda
sobre quem passa,
no ermo em que vivemos,
e a tudo abrasa),

...vai ser preciso se prover de palma
e de cantis, se esse deserto avança.
Plantar um inverno, e, se possível, calma.
Sonhar um açude e untar-se de esperança...





Eurico

14/05/2013


Imagem:
AbARCA,
de Emanuel Bezerra de Brito
Natal - RN